Olhei
para o meu cabelo castanho escuro no reflexo do espelho. Até que não estava tão
ruim. Os cachos naturais dele estavam leves e brilhantes. A maquiagem era leve
e ressaltava os olhos verdes que eu havia herdado da minha avó, Matilde. As maçãs
do meu rosto estavam rosadas. A bata branca que eu usava não ressaltava o pouco
de seio que eu possuía, mas formava um conjunto bonito com o short jeans,
deixando à mostra as coxas perfeitas que eu tinha trabalhado tanto para
conseguir.
Fazia
quatro dias que eu havia conhecido o Jacob, e o telefone dele estava gravado na
minha agenda, mas ninguém tinha me dado trégua para que pudesse ligar.
Ao
voltar para casa naquele dia, tive que escutar, ou fingir que escutava, as
broncas da minha mãe e da minha avó. O bom disso tudo?! Lana não tinha saído
dessa impune, e teve que me dar roupas novas. O cartão sem limites dela foi uma
ótima fada madrinha.
Esta
noite haveria outro encontro das madrinhas de Lana, e eu, como torturada número
cinco, estava intimada a participar. Segundo algumas conversas que escutei pela
casa, decidiriam alguns últimos detalhes do chá de cozinha, nessa reunião.
Peguei
o celular, deixando o número de Jacob na lista de números mais importantes, a
qualquer momento eu ligaria para ele, era só surgir uma oportunidade.
—
Eu queria fazer um chá de cozinha diferente — começou Lana, para minha
infelicidade.
—
E como seria esse diferente?
—
Não sei! Na despedida de solteira serão apenas mulheres, no chá de cozinha eu
queria apenas casais.
Eu
estava contendo meus sentimentos por ela, mas depois disso eu simplesmente
mandei o bom senso para o espaço. Olhei novamente para o celular em meu colo,
eu queria fugir dali e poder ligar para ele.
—
Casais? — Camila perguntou assustada.
—
É, casais! O Dimitri vem, e nós podemos fazer várias brincadeiras.
—
Isso não é bem ensino médio? — Pronunciei-me pela primeira vez.
—
Claro que não. — Deu-me um sorriso maldoso. — Não está com medo de brincar de
sete minutos no paraíso, está, Julliet? — Respirei fundo, buscando aquela
baboseira de paz interior.
—
Aquilo foi há doze anos — tranquei o maxilar. — Nada mais que um episódio
adolescente.
—
Que ótimo, porque eu quero que tenha essa brincadeira, mas só entre os casais
já previamente formados, é claro. Está anotando tudo aí, Joyce? — A coitada da
moça só assentiu, enquanto digitava furiosamente no smartphone.
—
E a decoração? — Sofia a questionou.
—
Quero tudo em tons de azul tiffany, pink e branco. Vai ser no jardim aqui da
casa da minha vó. O espaço é grande, só temos que organizar muito bem, e montar
grandes tendas enfeitadas com luzes de LED.
—
Vai ficar lindo! — Sofia era a mais sonhadora, e pelo que eu percebi o namorado
a enrolava há um bom tempo.
—
O que mais Lana?... — eu disse entediada, olhando para o aparelho em meu colo,
todas já começavam a desconfiar que algo estava errado.
—
Lista de convidados. Você vai ficar encarregada da lista de convidados.
—
Mas, Lana, a Julliet não tem acompanhante!
—
Pouco me importa, Camila. Se ela não tiver acompanhante, não entra na festa,
mesmo que tenha ajudado a organizar.
Senti
cinco pares de olhos me observarem atentamente. Eu fingi não ver isso e saí da
sala. Ligar para Jacob era minha prioridade, naquele momento.
Escutei
ansiosamente o barulho irritante da chamada, até que caiu na caixa postal.
Tentei mais duas vezes e aconteceu a mesma coisa. Afinal, por que eu estava
assim? Era só um cara.
Voltei
para onde as garotas estavam e me sentei como se nada houvesse acontecido,
ignorando completamente o sentimento de tristeza e pesar que caía sobre mim.
—
Você tem que arrumar um par, Julliet! Não tem ninguém que possa lhe acompanhar?
— Sofia me falou prestativa.
Olhei
para frente e pensei na possibilidade. Será
que... Não. Nem ouse fazer isso, Julliet.
—
Sinceramente, garotas, vocês acham que a Julliet tem alguém? Olhem para ela, é
bem sucedida no trabalho, mas de que adianta isso e não ter ninguém?
—
Eu tenho alguém, sim! — Quando me dei conta do que disse, tive vontade de me
bater.
—
É?! E quem é esse louco?
—
Mas você não disse que era solteira? — As outras questionaram.
—
Nós nos conhecemos há um ano, e não temos um relacionamento sério, por isso
disse que estava solteira.
—
Canalha! — Assustei-me com o grito de Joyce.
—
Como?
—
Ele te enrola há um ano, Julliet!
—
Não, ele não me enrola! — Apressei-me em corrigi-la. — Nós moramos em cidades
diferentes, fica difícil manter contato.
—
E como ele é?! — Se minha prima tinha a intenção de me humilhar, eu havia
virado o jogo completamente e ela, novamente, estava sendo ignorada pelas
próprias amigas.
—
É... Ele...
—
Não fique com vergonha, Julliet. Estamos entre amigas. — Pâmela falou e as
outras concordaram, menos, é claro, Lana.
—
Ele é alto — falei meio desesperada.
—
E o que mais? Fale, Julliet! Estamos curiosas. Para você gostar dele, deve ser
um homem e tanto.
É... Um homem e
tanto... Meu Deus, o que eu faço? Mal percebi o que saía
da minha boca, enquanto eu pintava um quadro do suposto homem.
—
Ele é moreno e tem um sotaque espanhol de matar qualquer mulher. O corpo dele é
perfeito, tudo em seu devido lugar. É engraçado e, quando nos conhecemos,
apesar de ter sido uma situação bem constrangedora, ele conseguiu me chamar
para sair sem eu nem mesmo perceber. Ele tem um sorriso lindo — sorri,
lembrando-me de quem eu acabara de descrever.
—
Você está apaixonada. — Sofia estava com os olhos brilhando.
—
O quê?!
—
Apaixonada por ele! E qual é o nome do felizardo?
—
Jacob Black — coloquei as mãos tampando minha boca, antes que eu falasse mais
alguma besteira.
—
Não conheço esse sobrenome — Lana falou. — É algum pobrezinho?
—
Olha, Lana, será que dá para não falar dele assim? Se você não me respeita,
tudo bem, mas não pode julgar alguém que nem conhece. — Ela fingiu bocejar,
mostrando não ter nenhum interesse no que falei.
—
E o que ele faz? Você ainda não disse. — Insistiu no assunto que eu não sabia.
—
Me deixe em paz, Lana!
Levantei-me
e subi as escadas, para o meu quarto, mas aí me lembrei de que ele também era o
quarto da minha querida prima. Dei meia volta, e já estava saindo quando a
própria me interceptou.
—
Por que está tão na defensiva, Julliet?
—
Não estou na defensiva.
—
Então por que não fala logo o que seu namorado faz?
—
Porque este assunto não lhe diz respeito.
—
Ah, na verdade diz, sim. Não pode trazer qualquer um para o meu chá de cozinha!
—
Como?
—
É isso que ouviu. Traga esse Jacob Black para o chá de cozinha, então veremos
se ele é ou não real, como você diz.
—
Não pode estar falando sério.
—
Está combinado.
Ela
me deu as costas e seguiu de volta para a sala. Eu tinha certeza de duas
coisas: ela nunca tinha falado tão sério em toda a sua vida, e eu estava
completamente ferrada.
Joguei
as mãos para o alto e passei-as por meus cabelos em um gesto claramente
nervoso. O celular vibrou na minha mão, e eu nem me dei o trabalho de olhar
quem era, só atendi.
—
Alô.
—
Jullie? — A voz rouca e carregada de sotaque me despertou.
—
Jacob?!
—
Sou eu — pigarreou do outro lado da linha. — Você me ligou mais cedo?
—
Liguei eu... Disse que ligaria, não?!
—
Desculpe não ter atendido, eu estava no banho.
—
Sem problemas.
Ficamos
em silêncio por um tempo. Por que mesmo
eu peguei o telefone dele?! Ah sim! Para não correr o risco de ele ser um
perseguidor estranho. A quem eu estou querendo enganar?!
—
Então... Tem algum plano para hoje à noite?
—
Não — pude sentir o sorriso em sua voz.
—
Podemos sair para jantar, o que acha?
—
Aonde vamos nos encontrar?
—
Não sei. Você escolhe o lugar.
—
Anota o endereço.
Corri
para pegar a agenda.
—
Nos vemos em uma hora? Certo?
—
Certo. Tchau Jacob.
—
Até mais.
Desliguei
o telefone me sentindo nas nuvens. Era estranho. Nunca tinha ficado tão animada
com apenas um encontro.
Escolhi
um vestido nude, com uma saia levemente rodada e decote discreto. Coloquei um
cinto só para marcar a cintura, e uma rasteira estilo gladiador. Não sabia que
lugar seria esse, mas se fosse formal ou não, estaria vestida apropriadamente.
Quarenta
minutos depois, eu desci as escadas e encontrei minha mãe, arrumando as flores
no vaso da entrada.
—
Vai sair?
—
Aham.
—
Encontro?
—
Talvez — sorri com sua cara de descrença. — Sim, é um encontro.
—
Ótimo. Divirta-se!
Localizei
o endereço no GPS e cortei caminho por um atalho. Apesar do enorme fluxo de
carros, cheguei ao meu destino com apenas quinze minutos de atraso. Até porque
não era muito legal chegar na hora certa, sempre tive a impressão de que quem
fazia isso, parecia desesperada aos olhos dos outros.
A
rua estava parada e, além do meu, possuía só mais dois carros estacionados.
Olhei novamente para o endereço no papel, e cheguei a pensar que talvez eu
tivesse anotado errado. Bom, se não fosse ali, eu ligava para Jacob e
perguntaria o endereço certo.
Atravessei
para o outro lado da calçada, e parei em frente a um prédio antigo. Apertei o
interfone no número escrito na agenda, e esperei alguém me atender.
—
Pois não.
—
Jacob, é a Julliet.
—
Achei que não viria mais.
—
Só estou atrasada alguns minutos. Abre para mim? — A trava fez um barulho e o
portão abriu.
—
Último andar — falou antes de desligar.
Entrei
no hall um pouco receosa. Ele havia me
convidado para jantar em seu apartamento?
O
elevador me encantou por ser um daqueles antigos, com porta estilo sanfona. Não
vou mentir dizendo que foi fácil mexer nele, mas eu consegui. E adorei.
Quando
cheguei ao andar, parei bem dentro do apartamento. Era a cobertura do que, na
época em que fora construído, era um prédio de luxo. O local era amplo e a sala
era bem simples, mas eu não conseguia encontrar simplicidade naquilo. Os móveis
eram abertamente masculinos, tudo lá exalava masculinidade, conforto e bom
gosto.
Jacob
apareceu poucos segundos depois da minha precária avaliação de sua casa. Usava
uma blusa de mangas estilo segunda pele, azul escura, marcando bíceps, tríceps
e todos aqueles músculos que eu não sabia o nome e nem me importava em saber. A
calça jeans de lavagem escura, também realçava seu corpo ao extremo. Nos pés
calçava um sapa-tênis. O cabelo negro estava naturalmente bagunçado. Era sexy.
—
Boa noite — beijou minha bochecha, me deixando zonza com o cheiro de vinho,
chocolate e algo totalmente único.
—
Boa noite.
—
Bem-vinda ao meu lar — fez graça enquanto me levava em direção à cozinha, que
era conjugada com a sala.
Assim
como a sala, aquele lugar também tinha a cara dele. Tudo era em inox, armários,
a geladeira, o forno e o cooktop. Era bem espaçoso, e ele se mexia com
desenvoltura, apesar dos quase dois metros de altura.
—
Você me convidou para a sua casa na primeira vez em que nos encontramos?
—
Segunda — entregou-me uma taça de vinho.
—
Certo, na segunda vez?
—
Qual o problema?
—
E se eu fosse uma maníaca?!
Ele
riu, e eu prestei atenção em como os músculos nas costas se tencionaram quando
ele se abaixou para abrir o forno, e tirar uma travessa que exalava um cheiro
delicioso.
—
E se eu fosse um maníaco?!
—
Isso mesmo! — Percebi tardiamente que ele estava rindo da minha cara.
—
Não vai conseguir me deixar arrependido, então, podemos partir para outro
assunto.
—
O que está cozinhando?
—
Surpresa. Mas... Você pode conter a curiosidade comendo alguns canapés.
A
travessa cuidadosamente decorada que Jacob me ofereceu encheu meus olhos. Dizem
que primeiro comemos com eles, se isso fosse verdade, os meus estavam
satisfeitos somente com os aperitivos. Na base dos canapés havia um pão que eu
não conhecia, depois vinha algum tipo de queijo ou requeijão, um galhinho bem
verde, um pedaço de mussarela, um pedaço de tomate e por fim, um pedaço de
azeitona. Aquilo parecia delicioso.
Não
errei no julgamento, quando provei era delicioso. Eu nunca tinha comido nada do
tipo.
—
De quem é a receita? — Perguntei observando-o arrumar os pratos do nosso
jantar.
—
Minha.
—
Você é uma espécie de chef?
—
Pode-se dizer que sim.
—
Com assim? Ou você é, ou não!
--
Fiz faculdade de gastronomia, mas nunca quis trabalhar no restaurante de outras
pessoas. Quero ter o meu próprio lugar, sabe?
—
E por que não tem?
—
Porque não é tão fácil assim conseguir dinheiro.
Entregou-me
a garrafa de vinho e sua taça.
—
Está vendo a porta da sacada?! — Apontou para a sala e eu assenti. — Vá até lá,
suba as escadas e coloque isso na mesa, lá em cima.
—
Não vamos jantar aqui?
—
Não.
Fiz
o que ele pediu. Subi os poucos lances da escada, e logo cheguei à cobertura.
Assim como o apartamento, ela era confortável e simples. Havia uma parte
coberta, que abrigava uma mesa de oito cadeiras e uma churrasqueira. Logo ao
lado, duas poltronas de couro preto foram colocadas estrategicamente longe da
churrasqueira, e ainda assim cobertas pelas telhas. A iluminação era feita
através de lâmpadas frias, também colocadas em lugares estratégicos.
Mas
o que me chamou a atenção, foi a mesa para quatro pessoas colocada exatamente
no meio do local. Os sousplats eram coloridos e lindamente bordados. Os pratos
quadrados e brancos estavam ao lado dos talheres finos. Senti-me lisonjeada,
nunca alguém havia sido tão atencioso comigo em apenas um jantar. Geralmente
nós só íamos para algum restaurante.
Assim
que coloquei as taças e o vinho sobre a mesa, Jacob chegou com os pratos, já
arrumando-os para começarmos a comer.
—
Bife à Parmegiana, acompanhado de arroz branco e batatas douradas.
—
Sinto que quanto mais tempo passo com você, mais peso eu ganho.
—
Isso é bom?
—
Em circunstâncias normais, não, mas não consigo pensar muito com essa obra à
minha frente.
—
Então coma.
—
Se faz tanta questão — sorri cortando o primeiro pedaço do bife e levando-o à
boca.
Minha
boca se encheu só com aquela pequena garfada. Eu não cansava de sentir como se
fosse a primeira vez que eu comia um verdadeiro Bife à Parmegiana.
—
Eu acho que você deveria montar pelo menos uma barraquinha! — Ele riu. — É
sério! Eu nunca comi algo tão bom. Nem minha avó te supera!
—
Ela não iria gostar de ouvir isso.
—
Provavelmente — dei de ombros.
—
E o que mais você faz? Além, é claro, da parte em que você cozinha
maravilhosamente bem?
—
Trabalho no mercado.
—
Por pouco tempo, suponho.
—
Eu não sei. Preciso conseguir dinheiro para montar o restaurante.
—
Já tentou ir a bancos?
—
Sim. Eles não emprestam dinheiro para um cara que não tem onde cair morto.
—
Duvido. Seu apartamento é lindo demais para alguém que não tem onde cair morto.
—
Eu o ganhei dos meus avós. Trabalhei desde os doze para poder comprar toda a
mobília. A cozinha foi um presente dos meus pais. O único dinheiro que eu tinha
foi gasto comprando um galpão antigo, na divisa entre os bairros.
—
Galpão?
—
Vem cá.
Jacob
levantou-se e seguiu para o extremo da cobertura, levando-me junto. Dava para
ver quase a cidade inteira dali.
—
A vista é linda.
—
Acho que esse foi o motivo dos meus avós o deixarem para mim. Eu sempre adorei
isso, a vista, a cidade. Eu nasci aqui e tenho orgulho disso. — O sorriso que
ele abriu ao falar isso me encantou.
—
Mas de onde vem o sotaque?
—
Morei na Argentina durante alguns anos. Minha mãe é de lá, e meu pai é de Los
Angeles. Conheceram-se enquanto ele trabalhava no controle de imigração e ela
estava quase sendo deportada.
—
E o que aconteceu?
—
Ela foi de fato deportada, mas meu pai percorreu meio mundo para encontrá-la novamente.
Casaram-se e depois deram entrada nos papéis para a cidadania norte-americana
dela. Estão juntos até hoje.
—
Bonito. Só não acredito que isso aconteça muito.
—
Também não, mas eles são meu exemplo.
—
Meus pais também, e meus avós, e meus tios.
—
Família grande?
—
Não faz ideia.
—
Tá vendo aquela luz vermelha bem na divisa entre os bairros?
Jacob
apontou para uma pequena claridade um pouco longe, mas não impossível de se
enxergar. Assenti.
—
Eu comprei para montar o restaurante.
Fiquei
de frente para ele, observando atentamente sua expressão de sonhador.
—
Não foi fácil, e todas as minhas economias foram para isso. Agora não sei
quando vou poder abrir o restaurante.
—
Vai conseguir, Jacob. Nada é fácil e você já tem o mais difícil que é o lugar.
O resto... Está encaminhado.
—
Você é muito otimista — olhou-me com incredulidade.
—
É um dom.
Meu
celular, dentro da bolsa, começou a tocar estridentemente. E eu corri para
pegá-lo antes que me fizesse passar mais vergonha.
—
Me desculpe — olhei no visor para identificar o número. — Preciso atender, é
minha mãe.
—
Sem problemas.
Virei-me
de costas para ele, e atendi.
—
Fiquei sabendo que você está num encontro, priminha.
—
Lana?! O que está fazendo com o celular da minha mãe?
—
Ela saiu para dar uns pegas no seu pai.
—
Poupe-me! E fale como alguém normal!
—
Não vou discutir meu modo de falar com você, Julliet. Só quero saber se já
disse pro seu Jacob que ele virá ao meu chá de cozinha.
—
Ele... — respirei fundo para não matá-la. — Tchau, Lana.
—
Tá nervosinha, é?! Aposto que ele ainda não te... — desliguei o telefone antes
de Lana concluir sua fala.
Desabei
na cadeira sem o mínimo de delicadeza.
—
Aconteceu algo? — Jacob parecia preocupado.
—
Aconteceu! Eu cavei minha própria cova esta noite — joguei o celular para longe
de mim. Não queria olhar para ele tão cedo.
—
Posso adivinhar? — Dei de ombros num gesto de “fique à vontade”. — Brigou com
sua prima novamente.
—
Isso não foi uma adivinhação, mas você está certo. Num momento de desespero, ou
era só eu tentando bancar a boazuda na frente dela, eu menti usando...
Parei
para pensar. Eu já estava ali com o Jacob, ele precisava de dinheiro e ajuda
com o restaurante, e eu precisava de ajuda com a Lana. A solução é tão simples...
—
Menti usando seu nome!
Seu
rosto estava assustado com minha súbita mudança de humor.
—
O que você faria para conseguir seu restaurante? — Mesmo receoso, Jacob me
respondeu.
—
Qualquer coisa.
—
E se eu dissesse que te ajudaria a concluí-lo, se você fizesse algo para mim?!
—
Um acordo?
—
Isso mesmo.
—
Toparia.
—
Ainda que não soubesse o que teria que fazer?
—
É o meu sonho, Julliet. Faço qualquer coisa por ele.
Engoli
em seco e ponderei a ideia. Minha intuição dizia que isso não daria certo, mas
a parte que adoraria ver a decepção nos olhos de Lana venceu.
—
Preciso que finja ser meu namorado — joguei a bomba.
—
Como?
—
Menti para Lana e disse que tinha um futuro pretendente, e que o levaria para
seu chá de cozinha, que será uma ridícula versão mais velha de “A Noite Adolescente”.
—
E disse que eu era o cara?
—
Não necessariamente você, mas um homem com as mesmas características e mesmo
nome. — Fiz uma careta digna de uma criança que é pega fazendo algo errado. —
Estou muito encrencada?
—
Julliet, você definitivamente não é uma mulher comum — encheu nossas taças, e
entregou uma para mim.
—
Isso é bom ou ruim?
—
Bom. Definitivamente bom.
—
Quer dizer que vai me ajudar?
—
Sim.
Mal
percebi quando pulei em seu colo e o abracei como se fôssemos velhos
conhecidos, ou pior, namorados.
—
Espontânea! Vai ser ótimo quando tivermos que fingir um relacionamento para sua
família.
—
Droga! Tinha que me lembrar disso?
—
Ah... tinha. Como também tenho que te lembrar de que teremos que saber tudo
sobre o outro. E podemos começar agora, o que acha? — Ofereceu-me um sorriso
irresistível.
—
Na verdade, podemos conversar sobre isso amanhã, no café enquanto planejamos
seu restaurante.
—
Tudo para te ver de novo.
—
Certo — levantei-me de cima dele, e tirei um poeirinha invisível do vestido. —
Preciso ir.
—
Você sempre tem que sair como a Cinderela?
—
Cinderela? — Soltei uma risada. — Pelo que eu saiba, nunca deixei um pé do
sapato para trás.
—
Mas sai correndo como se precisasse salvar o mundo.
—
Nos vemos amanhã, Jacob. Tenho seu endereço e você, — tirei a agenda da bolsa,
anotando meu endereço e o telefone fixo, depois arranquei a folha e a entreguei
para ele — agora, também tem o meu.
Jacob
me lançou um olhar indecifrável, que me deixou ainda mais intrigada quanto a
sua pessoa.
—
O jantar estava ótimo.
—
Foi bom ter vindo — assenti.
Eu
sempre ficava tímida e chateada quando tinha que sair de perto dele. Parecia
que eu nunca mais veria a pessoa que fez a diferença em minha vida em tão pouco
tempo.
—
Nos vemos amanhã — beijei sua bochecha longamente, tentando ficar com seu
cheiro por, pelo menos, até a manhã seguinte.
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