29 de março de 2014

Capítulo 4 (VCAM)

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Lana não havia dormido no quarto, essa noite, e eu suspeitava que o motivo era o seu tão falado noivo ter voltado de viagem. Provavelmente o resto da família estava se reunindo para o desjejum, logo me juntaria a eles só para conversar um pouco com Morgana, a prima que me era mais próxima.
Havia terminado de me arrumar, aproximadamente, às oito horas. Estava cedo, mas o nervosismo era muito maior que o bom senso. Desci as escadas e ia em direção à cozinha quando Jeremy apareceu, afobado.

— Senhorita! Tem um rapaz aí querendo entrar, e ele disse que é seu namorado.
— Quem?! — Perguntei assustada para o senhor que trabalhava naquela casa desde que eu me entendia por gente.
— Jacob Black.
— O quê?
— Jacob Black?! — Lana surgiu com um sorriso maldoso. — Ele é namorado da Julliet, Jeremy. Não sabia?! Pode deixá-lo entrar.

Jeremy procurou por desaprovação em meu rosto, mas tudo que encontrou foi espanto, por isso saiu e foi abrir o portão.
Um barulho de motor de moto ficou mais audível e parou repentinamente. Ele estava estacionando a moto e logo chegaria aqui. Desde quando ele tinha moto?

— Espero que não se importe, prima, mas o Jacob ligou para o seu celular mais cedo, e como você estava dormindo feito uma pedra, tomei a liberdade de atender e convidá-lo para um café da manhã em família, já que ele disse que iriam se encontrar para fazer o mesmo. Nada melhor que um café em família, não?

Não tive tempo para responder Lana à altura, porque quando eu me dei conta, Jacob entrava pela porta principal, vestido impecavelmente em jeans e camiseta. A combinação mais simples, que o deixava ainda mais deslumbrante.
Ele andou em minha direção e parou com o rosto a poucos centímetros do meu. Para onde tinha ido o combinado de primeiro conhecermos mais o outro, para depois posarmos de casal apaixonado para minha família?
Jacob era puro vinho e chocolate, e quanto mais perto ele ficava, mais atordoada eu me tornava. Até que os lábios dele tocaram os meus, e eu senti como se uma força me empurrasse diretamente para ele. Meus braços envolveram seu pescoço, e minha boca ganhou vontade própria quando resolveu aceitar aquele carinho e se abrir, mandando qualquer ideia de ingenuidade para o espaço. As pernas bambearam, e os braços dele seguraram minha cintura, fazendo todo o trabalho de me sustentar. A língua dele dançou contra a minha, me levando ao delírio. Seu gosto completava o cheiro, e eu me perguntava onde estive durante todo esse tempo sem aquele homem.
Quando finalmente nos soltamos, eu não conseguia pensar coerentemente, e meu coração batia tão rápido quanto a bateria de uma daquelas escolas de samba brasileiras. Eu apostava que meus lábios estavam vermelhos e inchados por conta do beijo, e os dele não ficavam atrás. Na verdade, a boca dele tinha ficado muito mais apetitosa daquele jeito.

— O que você está fazendo aqui? — Questionei-o em meio a sussurros.
— Não disse que tomaríamos café juntos? Aqui estou eu.
— Mas...
— Relaxe, Jullie. Relaxe e curta — piscou fazendo meu fraco coração dar um pulo.

Bom... Se já está no inferno...

Lana pigarreou, lembrando-nos de sua indesejável presença.

— Lana esse é... — Ela adiantou-se, apresentando a si mesma e pegando na mão do “meu” namorado.
— Jacob Black, já sei. Sou Lana Stacey.
— Muito prazer — sorriu o meu sorriso torto. Ele estava mesmo fazendo isso? Dei uma discreta cotovelada no seu estômago, para ver se ele desconfiava.
— Se nos dá licença, Lana, preciso conversar com o Jacob.
— Ah, não mesmo. Vamos tomar café agora — veio às nossas costas e nos empurrou para fora. — Todos estão nos esperando, e eu já mandei até colocarem uma cadeira para Jacob bem ao seu lado, Julliet, não é maravilhoso?! — Quase levantei as mãos e cantei glória, de tanta alegria. — Vó Matilde irá adorar saber que você tem um namorado. Ela vive fazendo campanha para você aumentar esse quadril de vara pau, e arrumar um marido — gargalhou.

Chegamos perto da mesa enorme, e das três menores que abrigavam toda a família. Minhas chances de nos integrarmos discretamente ao desjejum desabaram assim que Lana gritou para quem pudesse ouvir, que meu namorado estava ali para tomar café conosco.
Eu a mataria mais tarde.

— Namorado? — Os olhos da minha avó quase saltaram.

Minha mãe tinha a mesma expressão de Matilde, já os homens, principalmente meu pai, olharam para Jacob ao meu lado tentando intimidá-lo. Acho que essa reação se devia ao fato de termos poucas mulheres na família. Genética maldita!

— Você vai a um encontro num dia, e na manhã seguinte aparece com um namorado? — Meu pai avançaria em Jacob a qualquer momento.

Não me lembro de eles terem essa reação com a Lana.

— Pai, pessoal, esse é Jacob — segurei a mão dele com força. — Nós nos conhecemos há um tempinho, e resolvemos oficializar — dei um sorriso sem graça.
— Tempinho! — Minha prima precisava ser afogada na piscina outra vez, para aprender. — Jacob enrola Julliet há um ano! Não é demais?! — Olhou para os homens como se estivesse os atiçando.

Jacob estava com a expressão neutra, se eu pudesse dizer algo para ele, diria para mudar isso rapidamente, quanto mais vissem que ele não estava nem um pouco apaixonado por mim, mais ele apanharia. Mas até que era corajoso, meu último namorado que veio conhecer a família terminou comigo menos de uma semana depois.

— Então... Jacó — meu pai foi o primeiro a provocá-lo — por que demorou tanto para assumir minha filha? Por acaso queria apenas tirar a pureza dela e depois dispensá-la como uma mulher qualquer?

Não sabia onde enfiar minha cara. De onde ele tirou pureza? Se pureza significava virgindade, meu pai podia ficar despreocupado. O cara que a tirou estava bem longe, afinal eu mesma tinha tomado cuidado para que ele não aparecesse na frente de ninguém por um longo tempo.

— Não, senhor. Vim aqui justamente para desfazer esse mal entendido. Minhas intenções com sua filha são as melhores possíveis, e gostaria de pedir sua permissão para namorá-la.
— Como assim, permissão? — Sussurrei para ele.
— Relaxe, Jullie — respondeu da mesma forma, se aproveitando de minha distração para passar o braço pela minha cintura.
— E quais são essas “melhores intenções” com a nossa menina, Jacó? — Meu avô resolveu tomar a frente.

Jacob pigarreou, como se houvesse sido pego em sua própria teia.

— As melhores. Envolvem respeito, amor, fidelidade, cumplicidade, noivado, casamento e família.

Ouvi claramente as mulheres suspirarem, e os homens empurrarem suas cadeiras para enfrentar Jacob. Só eu percebi que seria uma luta injusta? Dezessete contra um! Felizmente, minha mãe resolveu intervir.

— Ah! Por favor — puxou meu pai de volta para a cadeira e veio nos cumprimentar. — Que bom que resolveram juntar-se a nós — abraçou e beijou Jacob, como se ele fosse seu filho. — Bem-vindo à família, Jacob! Não ligue para eles, é o excesso de testosterona por metro quadrado. Agora, sentem-se conosco e tomem seu desjejum.
— Obrigada, mãe — suspirei aliviada.
— Que é isso, filha. — Jacob estava se sentando, e eu também, quando minha mãe me puxou e cochichou em meu ouvido. — Dessa vez você acertou. Ele é um pão.

Acho que ela se empolgou demais na última parte, porque eu tinha certeza de que não só eu havia escutado.

— Então, quer dizer que eu sou um pão?! — Jacob levantou uma sobrancelha.
— Ignore minha mãe, às vezes ela se esquece... Esquece que é minha mãe, e que já passou da idade de ficar chamando os homens de pão.
— Sem problemas. Mas já que eu sou o pão, posso te chamar de chuchu? — Tentou segurar o riso e falhou.
— Por Deus! Sem esses apelidos ridículos.
— Tudo bem, eu posso te chamar de cariño.

O sotaque espanhol dele era perfeito, junte isso àquela voz irresistível sussurrando em seu ouvido, e a ponta do nariz passeando por seu pescoço. Eu começava a pirar.

— Não estamos sozinhos.
— E daí?
— Aposto que toda minha família está nos observando.

Jacob pareceu acordar e se ocupar com a comida à sua frente, porém, mesmo assim ele não desgrudou um segundo de mim.

— Quem fez esses bolinhos? — Ele perguntou depois de comer uns cinco de uma vez.
— Minha avó, por quê?

Meu “namorado” não me respondeu, só olhou para minha avó com adoração e disse:

— A senhora tem que me passar a receita desses bolinhos.

Minha avó, meio assustada com a empolgação dele, mal conseguiu dizer algo.

— É uma receita de família.
— Dona Matilde, – disse com uma voz sedutora, olhando para a senhora de cabelos completamente brancos e poucas rugas no rosto — eu sou praticamente da família! Nunca provei bolinhos doces tão espetaculares quanto esses.

Só de elogiar a comida da minha avó, ele já havia ganhado seu coração.

— Oh, meu filho, assim você me deixa encabulada. Essa é só uma receita de família que eu tentei passar para sua namorada, — olhou-me duramente — mas ela tem uma mão péssima para cozinha. Diga-me, você cozinha?

Percebi minha deixa e me intrometi na conversa.

— Jacob é formado em gastronomia, vó.
— É mesmo, meu jovem? — Estava perdendo meu namorado para minha avó.
— Sim, pela UCLA.
— Pela UCLA? Mas você não fez direito lá também, Jullie?! Conheceram-se na universidade, então?
— Não, nós nos conhecemos só ano passado.
— Que coisa engraçada é o destino, não? Estiveram perto um do outro por tanto tempo, e só muito depois que finalmente se encontraram — suspirou sonhadoramente. — Mas diga-me, Jacob, você trabalha aonde? Adoraria apreciar um de seus pratos em seu restaurante.

Percebi que ele tinha ficado um pouco sem graça com o assunto ‘restaurante’, e respondi eu mesma a pergunta.

— Jacob ainda está montando seu restaurante, vó. Nós íamos tomar café juntos, hoje, para tratar disso. Ele já tem o local que, diga-se de passagem, é muito bem localizado, e só precisa de uma pequena ajuda feminina. Daremos conta de reformar aquele lugar, então, em pouco tempo, poderemos apreciar seus pratos em um lugar só dele.

Virei-me para ele, e tenho certeza de que corei quando Jacob me dedicou o meu sorriso torto preferido.

— Oh! Mas isso não é problema. Nossa cozinha está a sua disposição, filho. Aposto que Julliet adoraria passar mais um tempo com você, aqui. Agora posso perceber como conquistou minha neta, — ele a olhou questionador — pela barriga, oras! — Minha família gargalhou. — Só sabendo cozinhar para essa aí gostar. Porque eu vou te contar filho, ela passa as noites comendo pizza e bebendo vinho, agora, diga-me: como alguém sobrevive só com isso?
— Vó... — Tentei pará-la.
— Mas é verdade! Como pode ver, Jacob, minha neta não gosta de tocar no assunto, mas agora que ela tem você, espero que consiga fazê-la comer direito.
— Ah, pode deixar, dona Matilde, comigo, Julliet nunca mais passará fome — sorriu junto com os outros. Bando de traidores!
— Okay. Todos já brincaram com a cara da Julliet, aqui, será que podemos seguir em frente, e falar de outra coisa?
— Não se irrite, cariño, — Jacob segurou meu queixo e virou meu rosto para perto do dele — eles só se preocupam com você, e eu vou me certificar de que minha mulher sempre esteja bem alimentada.

Se o objetivo era me deixar mais balançada por ele, conseguiu. Aquela farsa estava cada vez mais real, e olha que estávamos só no primeiro dia.

— Eles não são lindos juntos, Vivian?
— São sim, mamãe. Quase como Vincent e eu, quando éramos mais jovens.
— Você e Vincent eram muito mais comportados, querida. Na verdade, eu me lembro de que o seu pai se sentava entre vocês, e os três olhavam para frente, como se estivessem assistindo a um filme muito interessante. Enquanto eu não chegava e tirava seu pai de perto, os dois não conversavam. Era engraçadíssimo.
— É, mãe, engraçadíssimo.
— Aprenda, Jacob, se você quer realmente uma mulher, tem que correr atrás e perseverar. E se você gosta mesmo da minha neta quanto aparenta, não se preocupe com esse tanto de marmanjos tentando te intimidar, eles só se preocupam muito com Julliet, mas logo vão perceber que você é a escolha certa para ela.

A fala de dona Matilde deixou encabulado, não só Jacob, mas a mim também. Minha avó tinha um dom. E para impedi-la de soltar outra pérola, anunciei nossa partida.

— Mas já?
— Vocês nem comeram direito! E eu ainda tenho que passar a receita dos bolinhos para o Jacob!

Enviei para ele um olhar que dizia: “negue logo, ou...”, obviamente Jacob foi esperto o bastante para recusar educadamente o convite da minha avó. Despedimo-nos de todos, e quando saímos pela porta da sala, lembrei-me de que ele estava de moto.

— Vá na frente, eu te sigo de carro. — Eu me preparava para pegar as chaves do carro, quando ele me parou.
— Você vai de moto comigo.
— Sinto muito, mas terei que te contrariar. Como é que eu vou voltar?
— Eu te trago de volta.

Estava prestes a contestá-lo, mas ele foi muito mais esperto, segurando minha cintura com força e me puxando para sua boca. Esse beijo era muito mais intenso, com suas mãos apertando meu quadril, e seus lábios esmagando os meus sem piedade.

— Sua prima estava olhando.

Assenti sem saber realmente o que estava fazendo.

— Agora ponha o capacete, e sente-se na garupa.
— Mas...
— Não questione, Jullie, sabe que vai perder.

Encaixei o tal capacete e orei para não parecer ridícula.

— Não está feia — Jacob me tirou dos pensamentos.
— Como...
— Está fazendo aquela careta de dúvida e revirando os olhos. Sempre que faz isso, está na dúvida entre algo.
— Como sabe tanto assim, se nos encontramos apenas por poucos dias?
— Sou um cara observador.

Montou na moto e esperou eu fazer o mesmo.

— Já andou de moto antes? — Questionou-me ao ver minha hesitação.
— Não.
— Não minta, Jullie — olhou para meu, rosto tentando achar a mentira. — Tá de brincadeira? Não fugiu com um cara mais velho no ensino médio? — Neguei. — Saiu com um bad boy na faculdade? — Novamente neguei. — O que fez na melhor parte da vida?
— Estudei?! E tentei achar algo em que minha prima não me atrapalhasse.
— Certo, só monte como se fosse um cavalo — falou com uma voz incrédula.

Desajeitadamente, subi na moto, e quase bati o tornozelo no escapamento.

— Cuidado com o escapamento! Acredite em mim, não vai querer se queimar aí.
— Okay. Tomar cuidado com o escapamento.
— Não precisa ficar com medo, é só segurar firme — puxou minhas mãos e as cruzou em sua cintura.

Apertei minhas mãos com mais força, e escondi o rosto em suas costas.

— Não vou te deixar cair, cariño.

Por que ele me chamou assim? Não estamos mais na frente da minha família.

Jacob ligou a moto, e o motor rugiu em meus ouvidos me fazendo agarrar-me ainda mais a ele. Seu peito subiu e desceu numa risada muda. Quase o belisquei, mas preferi manter as mãos firmes, e não correr o risco de cair.
Saímos de casa a toda velocidade. Meus olhos mal viam as casas e os prédios que passavam por nós, tamanha rapidez.
Muito depois, percebi que viajar daquele modo não era tão ruim quanto eu esperava, e só então consegui apreciar melhor. Sentir a velocidade era ótimo, e o vento batendo em meus braços me dava a sensação de que eu poderia voar a qualquer momento. Óbvio que eu não tentaria, entretanto, imaginar não me custava nada.
O galpão era muito maior de perto, e por causa da localidade, tinha um movimento constante à sua porta. Jacob parou a moto e nós descemos. Enquanto ele procurava a chave, eu dei uma olhada na fachada da construção.

— Até que não é tão ruim aqui, hein?! — Brinquei com ele, recebendo um pequeno sorriso de volta.
— Dei minha vida para ter isso aqui. Tem que ser, pelos menos, não tão ruim.
— Conheço uma arquiteta que deixaria isso maravilhoso.

Ele abriu a porta e entrou para acender as luzes. Se eu achara que era maior de perto só olhando pelo lado de fora, por dentro era enorme. As paredes eram formadas por aqueles pequenos tijolos, assim como a casa dos meus avós, dando um ar rústico e ao mesmo tempo requintado ao lugar. O chão era de tacos, e deveria ser uma das primeiras coisas a serem trocadas.

— E quem seria essa arquiteta? — Jacob voltou para meu lado.
— Morgana Stacey. Minha prima.
— Ela estava no café da manhã hoje?
— Sim. Era aquela de cabelos louros platinados e olhos verdes.
— Bonita — comentou como se falasse do tempo.

Fechei os olhos em fendas e olhei para ele.

— Não fique com ciúmes, cariño, sou todinho seu — riu e me abraçou de lado.
— Posso chamá-la para vir aqui?
— Pode, sim. Quanto mais rápido, melhor.

Peguei o celular e tive uma breve conversa com Morgana. Ela só estaria livre após o almoço, então nós resolvemos sair e voltar mais tarde para encontrá-la.

— Aonde vamos, agora?
— Almoçar.
— Hum... Vai cozinhar para mim?
— Não. Você parece uma morta de fome, Jullie!
— Nossa... magoei. Só queria saber, porque...
— Vamos almoçar na casa dos meus pais.
— Ah! Seus pais? — Falei a última palavra gritando!
— Sim, por que o espanto?

Trancou o galpão e seguimos para a moto.

— São seus pais, Jacob! Como vai me apresentar para eles? Pai, mãe, essa é a Julliet Stacey, estou fingindo ser namorado dela, para que ela não seja humilhada pela prima.
— Vou te apresentar como a garota que eu conheci usando um babydoll cor de rosa, e um robe da mesma cor. A garota que aceitou tomar um café comigo, sem ao menos me conhecer. A garota que come pizza e bebe vinho ao invés de fazer uma refeição normal, como qualquer pessoa. A garota que faz uma careta linda quando está em dúvida, ou quando é contrariada. A mulher que aceitou me ajudar com meu restaurante, e não está fazendo isso só por causa de um estúpido acordo. A mulher que tem o melhor cheiro que eu já senti na vida, e que tem um corpo lindo, mesmo que os outros digam o contrário.

Abaixei os olhos para o chão, encabulada pelo que ele acabara de dizer.

— Não precisa ficar receosa em encontrar meus pais, cariño. Eles vão te adorar, e nem vão questionar qual a nossa relação.

Abracei-o com vontade, e apertei o rosto em seu peito. A felicidade só aumentou quando ele retribuiu o abraço.

— Obrigada, Jake.
— Do que me chamou?
— Jake — eu o olhei receosa. — Você não gosta? Se não gostar, eu...
— Está tudo bem, não tem problema em me chamar de Jake. Na verdade, só minha mãe me chama assim, e agora você — sorri contente. — Vamos, está ficando tarde, e logo teremos que voltar.

A casa dos pais do Jake não era tão grande quanto a casa dos meus avós. Era muito menor, mas tinha a mesma cara de lar que a segunda. Era pintada em um vermelho fosco e as janelas de branco, com aqueles canteirinhos cheios de flores, bem embaixo. A porta da frente era grande e robusta, feita, provavelmente de madeira de lei. O jardim era muito bem cuidado. Eu me sentia como se tivesse acabado de entrar em um daqueles livros com a mocinha sonhadora, e o cara sedutor, e que a qualquer momento ela apareceria correndo em seu vestido florido e esvoaçante, pronta para receber seu amado.
O quadro que eu pintei não ficou muito diferente da realidade quando uma mulher beirando os cinquenta anos apareceu, usando o bendito vestido de flores, e seu rosto iluminou-se ao ver o homem segurando fortemente a minha mão.

— Jacob!

Mal percebi quando ela correu para ele, que a levantou facilmente em seus braços numa demonstração clara de amor.

— Nunca mais fique tão longe de casa, menino! — O sotaque dela era muito mais carregado que o do Jacob. — Não sabe como fiquei preocupada com você. Sempre trabalhando tentando montar aquele bendito restaurante. Eu sei que é seu sonho, filho, mas...
— Saúde vem em primeiro lugar — falou num tom zombeteiro, mas sua expressão estava bem séria. — Eu sei, mãe.
— Acho bom mesmo, Jacob, senão, você volta para casa, e eu mesma me encarrego dos seus horários, igual a quando você era mais novo.
— Tudo bem, dona Sarah, vou me cuidar melhor, okay?
— Ótimo! — Ela olhou para o lado, parecendo finalmente me enxergar ali. — E quem é essa moça adorável? — Ela me mediu de cima a baixo e, só quando pareceu ter aprovado, me abraçou.
— Esta é Julliet Stacey, mãe. Julliet, esta senhora exagerada é minha mãe, Sarah Black.
— Prazer em conhecê-la, senhora.
— Oh, o prazer é meu, filha! Deve ser uma moça e tanto, para meu filho trazê-la aqui. — Ruborizei com a revelação.
— Não...
— Não precisa ter vergonha, querida! Jake nunca trouxe mulher alguma para cá, teve uma época que achamos que ele era gay, sabe? Toda aquela vontade de aprender a cozinhar, e nenhuma namoradinha!
— Não somos namorados — apressei-me em corrigi-la.

Ela olhou para Jacob, que nos seguia para dentro da casa, e depois para mim.

— Oh, certo. Não são namorados, desculpe-me — sorriu e depois sussurrou: — Esses jovens de hoje...

A parte de dentro era igualmente aconchegante, com enfeites e móveis em cores vibrantes e uma elegância sem igual. Apostava que fora ela quem deu os sousplats que Jacob usou em nosso jantar.

— Billy! — Gritou para nenhum lugar em especial. — Venha já aqui, homem! Seu filho acabou de chegar com uma — virou-se para mim — amiga!

Logo um homem pouco menor que Jacob apareceu na porta. Os cabelos eram curtos, e a pele era tão escura quanto a do filho. Na verdade, eu estava vendo o Jacob mais velho, só esperava que quando tivesse mais idade, Jake não tivesse aquela barriguinha saliente.
Eles se abraçaram rapidamente, dando aqueles tapinhas típicos de macho nas costas um do outro.

— Pai, essa é Julliet Stacey.
— Stacey?! Igual aos Bancos Stacey? — Assenti sem graça. — Filho...
— Que foi, pai? Não fiz nada errado! — Ele levantou a sobrancelha, igualzinho ao Jacob.
— Tudo bem. — Abraçou-me com força, me levantando do chão. — Sou Billy Black. Seja bem-vinda, minha jovem.
— Obrigada — sorri sem graça.
— Sentem-se — Sarah falou — eu vou terminar o almoço.
— Precisa de ajuda, mãe?
— Não, filho. Fique aqui com seu pai e Julliet, logo sua irmã chega aí com o Paul.
— Com o Paul? — Fez uma cara de indignação.
— É Jacob, e pare de fazer essa cara. Paul é um rapaz direito, e faz bem para Rachel.
— Fazer o quê, não é, mãe?
— Jake sempre foi muito ciumento, — falou para mim — quando era criança, ele tinha uma manta. Chamava-a de manzim, era uma graça. Quando tentávamos tirá-la dele, ele chorava que chegava a soluçar, depois que ficou maiorzinho e andava para lá e para cá, falando pelos cotovelos, nós escondíamos a manta de propósito, só para vê-lo procurar por ela na casa toda, e depois que não achava, sentava-se aqui na sala, emburrado, e não falava conosco até lhe devolvermos a manta — comecei a rir, mas segurei quando o vi olhando para mim com cara de quem não estava gostando nada, nada da conversa.
— Meu bem, sabe que Jacob não gosta que contemos suas histórias de criança. — Billy sorriu na cara do filho.
— Esse menino anda é muito mal-humorado — e dizendo isso, entrou na cozinha. Billy balançou a cabeça, sorrindo para a mulher.
— Jacob, eu preciso conversar com você — olhei para os dois, e notei que estava sobrando.
— Eu vou à cozinha — apontei para a porta. — Ver se a sua mãe precisa de algo. Com licença.

Jake nem retrucou, dizendo que eu não sabia cozinhar, ou algo do tipo, só concordou e saiu para a varanda com seu pai, enquanto eu seguia pela porta por onde sua mãe tinha entrado.

— Dona Sarah?!
— Oh, venha aqui, querida! — apareceu por entre uma fresta, de onde eu imaginava ser a dispensa.

A cozinha era mais parecida com a de Jake. Os aparelhos modernos e em inox, porém as cores vivas ainda eram presentes, ali.

— Deixe-me adivinhar: Billy resolveu conversar com Jacob, não é?
— Foi isso mesmo — segui o cheiro delicioso de especiarias.
— Estou fazendo nhoque, querida, quer me ajudar? — Eu a olhei com medo.
— Desculpe-me, dona Sarah, mas eu não consigo colocar uma água para ferver sem me queimar! Minha avó desistiu de tentar me ensinar a fazer algo na cozinha — sorri com vergonha.
— Não tem problema, Julliet. Cá entre nós, Jake pode cozinhar muito bem para os dois. — Dona Sarah tinha uma incrível capacidade de me fazer corar. — Você pode ajudar a colocar a mesa.

Concordei e, seguindo as instruções dela, arrumei a mesa para o almoço com louvor. Seis pratos, a mesma quantidade de copos e sousplats lindos, eu havia me apaixonado por eles.

— Foi a senhora que deu os sousplats para o Jake?
— Os do apartamento dele?
— Isso. — Assenti.
— Foi sim. Eu os faço.
— São lindos, delicados, e simplesmente incríveis. Poderia fazer em grande escala?
— Para quê? Se não estiver sendo intrometida...
— Claro que não! É para o restaurante do Jake.
— Mas, ele disse que iria demorar um tempo até que começasse a reformar o galpão.
— Na verdade nós começaremos a decidir isso hoje, mas eu acho que não há mal em já encomendar os sousplats, tenho que confirmar com minha prima Morgana, que será a arquiteta responsável pelo projeto, mas acho que ela também concordará que eles ficarão incríveis no restaurante.
— Está mesmo ajudando o Jake?
— Estou... — Olhei para a mesa posta, numa tentativa de desviar minha atenção. Sarah tinha algo que me fazia querer não mentir para ela. — Mas não estaria ajudando, se não fosse um acordo que fizemos.
— Acordo?
— Sim, eu...
— Não precisa se explicar, filha. Sei que tem alguma coisa por trás desse relacionamento de vocês, mas não está ajudando meu filho por conta de um acordo.
— Como sabe?
— Na Argentina tínhamos um ditado: “El peor ciego es el que no quiere ver”. Entende o que eu digo, filha? — Neguei. — O pior cego é aquele que não quer ver. Precisa abrir seus olhos, antes que seja tarde demais.
— Sarah! — A voz de trovão de Billy ecoou pela cozinha. — Já está enchendo a cabeça da moça com caraminholas?
— Oh! Não fale assim comigo, William Black! — Levantou a colher de pau na direção dele.
— Cuidado com isso, mulher! — Segurou a colher e puxou a mulher para perto de si, a abraçando pela cintura.
— Billy, temos visitas — Sarah falou com a voz fraquinha.

Sorri dos dois, e fui encontrar-me com Jake. Ele estava sentado no sofá da sala, olhando pela janela da frente.

— Eles estão naquela bolha e se esqueceram de você? — Perguntou virando-se para mim.
— Isso mesmo. Como sabia?
— Sempre fazem isso. Parece que são namorados, e não que têm quase trinta anos de casados.
— É bonito.
— É, mas quanto maior o tempo de convivência, pior fica.
— Eles são apaixonados, Jake. Deixe-os serem felizes — retruquei.
— Deixarei.

Pegou-me pela mão, e me levou para um corredor que eu não havia notado ali. O corredor era o acesso para quatro portas. Jake abriu a da esquerda, com um desenho de um garoto com o dedo do meio levantado, e com uma frase escrita com letras grandes e garrafais: “Nem pense em entrar se não for minha mãe, ou não tiver um quinto membro entre as pernas”.

— Que acolhedor!
— Eu era só um adolescente!
— Meio revoltado, e nem um pouco equilibrado. Não me admira que seus pais achassem que você fosse gay.
— Por quê?
— Qual adolescente com hormônios em fúria, nunca quis levar uma garota para seu quarto e fazer cosas malas com ela?
Cosas Malas? — Gargalhou. — Essa é única coisa em espanhol que sabe? — Dei de ombros.
— Sei o básico para não me dar mal em algum país que tenha espanhol como língua oficial.
— Menos mal.

Parei para observar o antigo quarto dele. Cama simples de solteiro, uma colcha preta cuidadosamente estendida. Luminária simples. Era um contraste e tanto com o resto da casa, colorido contra preto e branco. Uma escrivaninha de madeira escura sob a janela, mural de fotos com imagens dele em várias idades, e um mapa mundi enorme, grudado bem ao lado. Aproximei-me e corri os dedos por cada lugar marcado no mapa. Brasil, Chile, México, Itália, Portugal, França, Inglaterra, Índia, Egito, África do Sul, Rússia, China e Japão.

— São os lugares onde eu queria ir quando era mais novo — seguiu os dedos pelo mesmo caminho que os meus fizeram, até chocar-se com minha mão. Retirei-a rapidamente.
— Foi em algum?
— Só Brasil, Chile e México.
— Até hoje só viajei pelo país e para a Itália.
— O que foi fazer na Itália?
— Mestrado. Ganhei uma bolsa.
— Tem vinte e cinco anos, e já é mestre? — fiz uma careta.
— Não é grande coisa. É só algo que uma pessoa sem vida social faria.
— E por que não tem vida social?
— Porque... — suspirei. — Não sei. Festas me lembram da Lana e...
— Qual o seu problema com sua prima?
— Nós sempre tivemos pensamentos divergentes, mas o marco foi quando tínhamos treze anos, e ela resolveu dar uma festinha, daquelas com refrigerante, salgadinhos e várias pessoas que eu não conhecia. Mas eu estava ali porque minha avó a tinha obrigado a me chamar. Estudávamos em uma escola pública, porque meus avós diziam que dinheiro não nos diferenciava de nenhuma das outras pessoas, então seu grupo de seguidores era enorme e, naquele dia, não havia só pessoas do grupo dela, na festa. — Sentei-me na cama, e ele ao meu lado. — Num dado momento da noite, Lana resolveu brincar de sete minutos no paraíso, e me chamou para completar a roda, que tinha que ser par. Eu estava com medo, nunca havia beijado ninguém e eu saí com um garoto que teria que fazer comigo exatamente o que eu temia. Nós entramos no armário, e eu não sabia o que fazer, e ele também não, mas tentamos. Foi um desastre. Tentamos nos aproximar, mas o garoto bateu a mão na minha boca, meus lábios sempre foram muito finos, então, com o impacto, incharam e ficaram mais vermelhos que nunca. Mesmo assim prosseguimos com a brincadeira, e o beijo foi babado e nojento. Quando saímos, Lana estava escorada na porta, nos espionando, e assim que viu meu rosto gritou: “Boca de Sapo”. O apelido pegou, eu me senti humilhada e quase deixei de ir à escola por isso. Fim.
— Em qual escola você estudou?
— Eu te falo tudo isso, e você me pergunta em qual escola eu estudei? — Sorriu de lado. — Emmerson Middle School — uma sombra passou por seus olhos, e eu me perguntei se ela fora real. — Por quê?
— Curiosidade. Mas você não deveria ter ligado tanto para isso.
— É, mas quando se é uma adolescente com pouca ou quase nenhuma autoestima, você passa a se afetar com o que os outros falam.
— Isso passou, Jullie. Não foi culpa sua nem do garoto.
— Eu sei. Foi a partir desse dia que eu comecei a brigar mais com Lana. Nossas brigas passaram de bate boca para agressões físicas. Nunca passei tanto tempo de castigo, o que era péssimo, e não me ajudava em nada a tirar a lembrança ruim do primeiro beijo.
— Foi tão ruim assim? — Perguntou rindo.
— Poderia ter sido pior, mas o garoto tinha um cheiro... — sorri com a lembrança.
— Melhor que o meu? — Sorri.
— Na verdade, é exatamente igual — olhei para ele com dúvida. — Estranho, não?
— É... Estranho.
— Jake! Julliet! — Dona Sarah gritou. — Rachel acabou de chegar com Paul, venham almoçar!

Levantamos e fomos para a cozinha, sem dizer uma palavra. Eu ainda estava cismada com essa coisa de cheiros, e Jake estava mais silencioso do que nunca.
A garota da lanchonete estava lá, e a cara dela não era uma das melhores, assim como no dia em que nos vimos pela primeira vez. Já o Paul, tinha um sorrisinho zombeteiro no rosto, e olhava de mim para Jake.

— Até que enfim levou uma garota para aquele quarto, cara! Já estava preocupado com você. — Jake se limitou a fechar a cara, exatamente como a irmã.
— Paul, pare de importunar Jacob! — Sarah tratou de defender o filho. — E seja educado, temos visita, hoje! Essa é Julliet e, Julliet, estes são Rachel, minha filha mal educada, e Paul, o namorado piadista.

Paul abraçou-me e beijou meu rosto, demonstrando sua imensa alegria em saber que o amigo não era gay, mesmo comigo dizendo que Jake e eu éramos só amigos. Rachel me deu um aperto de mão, e correu para sentar-se à mesa.
Apesar do clima tenso por parte da irmã, o almoço foi agradável e eu me senti acolhida, como nunca estive em qualquer outro lugar. Decidimos ir quando Morgana me ligou avisando que estava saindo do trabalho, e seguindo para o “restaurante” do Jake.

— Volte mais vezes, filha.
— Voltarei, dona Sarah, é só o Jake me trazer — ela me olhou estranhamente, igual à primeira vez que me ouviu chamando Jacob pelo apelido.
— Esse filho ingrato nem vem me visitar. Venha sozinha, e eu te darei umas dicas de...
— Sinta-se à vontade para nos visitar, Julliet. — Billy interrompeu a esposa, que iria dizer algo constrangedor.

Despedi-me dos outros, e depois de algumas recomendações de dona Sarah para Jake, seguimos nosso caminho. Chegamos e o carro de Morgana já estava estacionado, e ela nos esperava ao lado do portão.

— Oi, Morgana! — Cumprimentei-a logo depois de descer da moto.
— Não sabia que agora você andava de moto — me olhou incrédula.
— É bom, além disso, Jake não me deu outra opção.
— Ah! Tinha que ter dedo do “Jake” nisso — sorriu enquanto balançava a cabeça em negativa.
— Morgana — ele chegou perto de onde estávamos.
— Olá, Jacob. Julliet me falou pouca coisa sobre o restaurante, já que ela não é a dona. Poderia me mostrar e ir falando mais ou menos o que você quer? Cores, estilos, tudo isso ajuda a deixar mais a sua cara.
— Tudo bem.

Passamos a tarde lá dentro, com Jacob falando mais do que nós duas juntas, e Morgana fazendo anotações de tudo o que podia. Eu dava meus palpites, quando necessário. Rapidamente a tarde passou, e logo eu estava parada na porta de casa.

— Obrigada pelo dia. Nos vemos amanhã? — Saltei da moto. — Já estou pegando o jeito com essa coisa.
— Coisa, Jullie?!
— Moto. — Rolei os olhos.
— Melhorou... e sim, nos vemos amanhã.

Levantou da moto e deu a volta, para ficar mais perto.

— Até amanhã, então.
— Até — me abraçou, e encostou a boca no meu ouvido. — Fala para sua prima que você não tem nada parecido com uma boca de sapo. E que seu beijo é muito, muito bom.

E como para confirmar o que acabara de dizer, me deu um beijo de tirar o fôlego. Eu tinha a sensação de que beijar Jake seria sempre como a primeira vez. Coração batendo rápido de ansiedade, palmas das mãos suadas, o resto do mundo desaparecido, e aquela vontade enorme de levantar o pé, como as mocinhas dos filmes de romance. Talvez fingir que eu namorava Jacob Black não fosse tão ruim, assim.


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