—
Eu não vou pedir comida, Julliet.
—
Qual o problema?! Estamos aqui desde as nove! O que me faz acreditar que ou
você foi demitido, ou pediu demissão.
—
Nenhum dos dois. Cobrei meus quarenta e cinco dias de férias, que estavam
atrasados. E o problema em pedir comida é que eu não confio no que colocam nos
pratos.
—
Qual é, Jake! Você vai ter um restaurante, e está com medo do que os outros
colocam na comida?
—
Minha mãe sempre disse para evitar comidas da rua.
—
Não é da rua! É do restaurante japonês mais famoso da cidade!
—
Outro motivo para não pedir. Ele será meu concorrente. Agora, continue olhando
essas revistas de decoração, enquanto preparo uma macarronada.
—
Quer ajuda?
—
Só se for para destruir minha cozinha — olhei-o de boca aberta por conta da
resposta. — Não me olhe com essa cara, cariño,
você sabe o quanto é perigosa em uma cozinha. Semana passada quase explodiu o
prédio todo.
—
Foi sem querer.
—
Eu sei, mas é melhor ficar em locais seguros — sorriu arteiro, e depois saiu
correndo quando tentei lhe acertar uma almofada.
—
Vá, vá rindo. Quando menos esperar, Jake, eu te pego!
—
Estou contando com isso.
—
Idiota!
—
Eu ouvi isso.
—
Esperava que ouvisse, mesmo.
Peguei
o controle e liguei o som, imediatamente a trilha sonora de Chicago começou a
tocar. Eu havia levado o pen drive com as músicas há alguns dias. Não posso
dizer que Jake ficou muito feliz com isso, mas eu dei meu jeitinho... Ou quase.
—
Troca de música!
—
Mas essa é boa!
—
Coloca aquela das desequilibradas.
Segundo
Jake, Cell Block Tango era uma música de psicopatas. Eu não discordava, matar o
marido porque ele gostava de fazer bolas com o chiclete não é lá muito normal,
mas eu preferia não falar mal da minha música favorita.
—
Poderíamos colocar luminárias mais baratas.
—
Onde vamos achar isso?
—
Eu sei fazer algumas que ficariam lindas, e combinariam perfeitamente com o
ambiente.
—
Jullie... — Virou-se para mim em dúvida. — Tem certeza de que consegue fazer
algo não destrutivo?
—
Ignorarei isso, ouviu, Jacob Black? E para te provar, vou roubar um pote de
plástico seu, e aquela toalha super colorida, que você odeia — levantei-me.
—
Não chegue perto.
—
O quê?
Ele
correu para pegar a vasilha e a toalha, e colocou-as sobre o balcão, que
separava a cozinha da sala.
—
Isso tudo é medo?
—
Precaução.
—
Quem diria, Jake. Um homem deste tamanho, com medo de uma mulher quase três
vezes menor que ele.
Balancei
a cabeça sorrindo. Peguei as coisas e fui procurar cola branca, tesoura e uma
lixa. Depois que achei tudo de que precisava, sentei-me na varanda e coloquei
as “mãos na massa”. Passei a cola sobre a superfície exterior do vasilhame, e
joguei a toalha por cima, tomando cuidado para não deixar nenhuma bolha. Após
cobrir toda a vasilha, cortei o excesso da toalha e lixei as partes que
sobraram na borda. Fiz um buraco com a tesoura no fundo da vasilha, por onde o
fio iria passar, e estava pronto!
—
Jake! Me ajuda a colocar?
—
Colocar o quê? — Apareceu à minha frente em um segundo.
—
Isso. — Apontei para a luminária.
—
Tem certeza de que isso vai dar certo?
—
Não menospreze meu trabalho! Só cale a boca e coloque na lâmpada em cima da
mesa.
—
Achei que o apartamento fosse meu — sorriu irônico, enquanto entrava e subia na
cadeira para colocar a luminária.
—
É seu! Só achei que precisava de alguma coisa para provar que minha ideia vai
ficar excelente no seu restaurante. Sem falar que, o seu apartamento precisa de
um toque feminino, além, dos sousplats, é claro.
Ele
me ignorou e continuou o serviço. Quando terminou, admirei minha obra.
—
Eu disse que ficaria bonito.
—
É... Dessa vez você acertou — abraçou-me de lado.
—
Quando é que eu não acerto? — Olhou-me incrédulo. — Okay. Mas tem que admitir
que ficou bom... Agora é só fazer umas cinquenta.
—
Não seriam quarenta e nove com essa?
—
Não. Essa é sua — sorri para ele. — Para se lembrar de mim.
—
E me diz quando é que eu não me lembro! — Dei de ombros.
—
E essa comida sai ou não sai hoje? Preciso de forças!
—
Para quê? Vai ficar sentada aí o dia inteiro.
—
Meu chefe vai me mandar alguns casos para eu avaliar, então, eu tenho que ir.
—
Não vai, não.
—
Como? — Prendeu-me entre a mesa e ele.
—
Seu notebook está aí e, caso tenha esquecido, eu ainda tenho caneta e papel.
Você vai passar a tarde comigo, cariño.
—
Pediu com tanto jeito, que eu vou aceitar sua proposta.
—
Não foi uma proposta, cariño. Você
vai ficar aqui, e eu só vou te devolver à noite.
—
Isso “se” ninguém ligar atrás de mim.
Empurrei-o
para trás, e voltei para meus afazeres. Liguei o notebook entrando logo em meu
e-mail. Baixei os arquivos do trabalho, e depois li por cima as outras
mensagens, apagando os anúncios. Infelizmente, no meio da bagunça que era a
minha caixa de entrada, encontrei um e-mail de Lana, enviado naquela manhã.
Abri-o e, imediatamente, me arrependi de tê-lo feito.
—
Jake?! Seus planos de passar a tarde sem fazer nada acabam de ser frustrados.
[...]
—
Okay. É só respirar fundo — repeti, olhando-me no espelho novamente para ver o
vestido que me obrigaram a colocar. — Não. É uma péssima ideia respirar fundo.
Se eu respirar, esse pedaço de pano vai explodir, e vou ter que explicar a
todos o que aconteceu.
—
Você está bem, Jullie? — Jake bateu na porta pela terceira vez.
—
Estou bem. É só esse vestido que é ridículo! Como esperam que eu possa dançar
com essa coisa longa e apertada em volta de mim?
—
Deixe-me ver.
—
Não! Está ridículo!
Ele
abriu a porta e me tirou de dentro do provador, que era tão apertado quanto o
vestido.
—
Não está tão ruim.
—
É — as outras madrinhas concordaram.
—
Você tem um corpo lindo, Julliet, é magra e o vestido vermelho caiu super bem
em você. — Joyce falou. — Agora, olhe para mim! Eu pareço com uma daquelas
bexigas compridas, sabe?! Vestido bege e cabelo loiro, está horrível.
Escutei
uma risada e olhei para Jake, que se divertia à custa das mulheres. Ele fora o
único homem que aceitara nos ajudar com a roupa. Nós estávamos em uma escola de
dança, que Lana havia alugado para nós ensaiarmos as coreografias do casamento.
Aula de dança para casamento... Não precisavam inventar mais nada.
—
Ainda não gostei do vestido — insisti. — Parece que a qualquer momento ele pode
rasgar e...
Parei
de falar quando Jake se agachou e pegou a barra do meu vestido. Agarrou com
força as duas partes bem seguras pela linha, e deu um forte puxão, rebentando a
costura e deixando um rasgo enorme que ia até a minha coxa.
—
O que você fez? — Para melhorar, Lana apareceu querendo arrancar a cabeça dele.
—
Dei um jeito no vestido — deu de ombros, como se não fosse nada.
—
Esse vestido é de alta costura, tem noção de quanto custa?
—
Tenho apenas a certeza de que você os escolheu para que elas ficassem ridículas,
e você fosse a bola da vez, como sempre tenta ser.
—
Como ousa? — Deu um passo na direção dele, e eu entrei em sua frente
desafiadoramente.
—
Poupe-nos, Lana. Jake tem razão — olhei para ela, percebendo o quão cômica a
situação estava. — Vamos para essa aula, então logo não teremos que aturar mais
a sua cara.
Segurei
a mão de Jake e nos tirei dali, feliz por poder andar normalmente, e por ter
colocado minha prima em seu lugar.
—
Mexam-se! — O professor assumidamente homossexual nos batia com uma régua,
enquanto tentava ensinar os casais a dançarem tango. — Vamos, queridos! Tango é
uma dança sensual, dos corpos entrelaçados, de sedução. Acham que estão
seduzindo algo?! — Apontou para nosso reflexo no enorme espelho da sala. — Sua
mãe. Essa é a resposta. Estão seduzindo sua mãe! — Gritou estridentemente.
Jake
riu baixinho no meu pescoço, e apertou levemente minha cintura, me deixando
arrepiada.
—
Está rindo do quê?
—
Olhe só para ele... Tentando ensinar tango, quando nem ele sabe — soltei um
riso que foi pego pelos olhos azuis e perspicazes do senhor Theodore, o
professor.
—
Eu ouvi uma risada. Quem riu? — Virou a régua em minha direção, encostando-a em
minhas costas por apenas alguns segundos, já que Jake me puxou para longe.
—
Acho melhor tomar cuidado com para onde aponta essa coisa — falou numa voz
grave, e eu notei o tal professor tremer.
—
Posso apontar outra coisa, bonitão — tentou dizer sensualmente.
Senti
Jake tencionar o corpo, e pousei a mão em seu peito, numa tentativa ridícula de
acalmá-lo. Superando minhas expectativas, ele relaxou e segurou minha mão
exatamente onde ela estava, quando tentei retirá-la.
—
Você acha que sabe tango? — Meu falso namorado perguntou nervoso.
—
Eu não sei tango, benzinho... Eu sou o Tango! — Balançou os braços finos com
falsa feminilidade.
—
Okay.
Jake
me deixou no meio salão, foi até o som e mudou a música. Tirou a camisa preta
de gola polo que vestia, e ficou só com a regata branca que usava por baixo,
deixando os braços musculosos e morenos mais à vista. Andou sensualmente em
minha direção, me avaliando com um olhar de gato. Deslizou a mão esquerda
suavemente pelas minhas omoplatas, e deteve-se um pouco acima da minha cintura,
a outra mão passeou por meu braço e segurou firmemente minha palma.
—
O que pensa que está fazendo?
—
Mostrando para o senhor Theodore como se dança tango.
—
E como fará isso?
—
Minha mãe é argentina, cariño, seria
uma ofensa a ela se eu não soubesse dançar tango — sorriu travesso, enquanto eu
o olhava assustada.
—
Você sabe, eu não.
—
Acabou de fazer todos os passos certos. Só precisa me seguir.
—
Seguir você? Como assim, seguir você?
—
Calada, cariño.
Fiz
exatamente o que ele disse, quando me puxou de encontro a seu corpo num
movimento brusco. Deu um passo para o lado e eu, por pouco, não pisei em seu
pé.
—
Viu?! Eu disse que não sei dançar isso! Vou fazer você passar vergonha. É
melhor chamar outra pessoa.
Ele
se concentrou em meu rosto, e falou sem ao menos piscar:
—
Quer que eu chame Lana? — Fechei o semblante na hora. — Quero dançar com você, cariño. Confie em mim, você sabe o que
tem que fazer.
—
Não sei, não.
—
Feche os olhos.
—
O quê?
—
Confia em mim?
—
É claro que confio! Mas o que isso tem a...
—
Fique calada e feche os olhos — falou usando um tom autoritário, que me deixou
estranhamente nervosa e ansiosa por mais.
Fiz
o que ele mandou, me tornando muito mais consciente de suas mãos no meu corpo,
e de meus seios encostados em seu peito. Tranquei a respiração.
—
Relaxe, cariño. Só tem que me seguir.
— Engoli a resposta que pensei em dar a ele, e arrisquei aceitar aquilo.
Senti
o ritmo entrando por meus poros, e a vontade de me mexer era enorme, mas Jacob
havia me pedido para segui-lo. A tensão era palpável. Explosiva. Quente.
Esperava aflita por qualquer movimento que pudesse vir dele. E quando este
finalmente veio, eu o segui. Submeti-me aos seus desejos e gracejos.
Suas
mãos eram hábeis e fortes. Seus braços em torno de mim levavam-me para um mundo
novo, desconhecido até aquele instante. Nossos corpos eram uma extensão um do
outro. Os movimentos bruscos vindos dele e os meus, leves e ao mesmo tempo
fortes, deixaram-me fascinada.
O
corpo forte de Jacob sempre procurando pelo meu, enquanto eu me esquivava com
delicadeza, me dava a certeza de que dessa vez, eu estava fazendo certo. Tango
era a dança das provocações. Quando ele se cansava de me chamar, eu o atraía e,
novamente, ele caía em minha teia de delírios e sensualidade, de encantos e
paixões.
Seu
cheiro, sua voz, tudo nele me obrigava a sentir o medo do envolvimento, mas me
fazia querer mais, sentir mais, viver mais, ter mais um pouco dele a qualquer
custo. As mãos de Jacob deslizando possessivamente sobre meu corpo. Seu nariz
passeando por meu pescoço enquanto ele me girava e deixava minhas costas contra
seu peito. Sua respiração pesada me deixando arrepiada a cada arquejo.
Eu
não precisava dos meus olhos para experimentar cada sensação que a dança, a
música e ele me traziam. Eu não precisava enxergar para saber o que Jacob
queria, eu só precisava segui-lo. Eu só precisava me submeter. E eu ansiava por
cada segundo em que eu seria dominada por aquele homem.
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