Jacob fazia a ronda pela
floresta quando Seth apareceu em sua cabeça de supetão. Sua voz mental beirava
o tom de “vida ou morte” e, foi somente por isso, que ele aceitou a “ordem” do
terceiro no comando.
Logo, os cinco lobos pararam
em um círculo perfeito e sentaram-se sobre as patas. Jacob parecia o centro de
tudo e de seus lados direito e esquerdo estavam Seth e Embry, Brady e Collin,
respectivamente.
— O que é tão urgente, Seth? –
A voz mental de Jacob tinha um tom ácido.
— Nossa função aqui.
— E o que tem ela? – Collin
também não entendia o motivo da reunião feita às pressas. Ele estava cansado,
deveria estar em “casa” desde a parte da tarde, sendo substituído por Seth, mas
o cara desaparecera.
— Estamos errando. Conversei
com a Kahli hoje e...
— Então foi isso que você fez
a tarde inteira? – Collin interrompeu-o no exato instante em que ouviu-se um
rosnado. A pseudodiscussão dispersou-se enquanto todos olhavam para Jacob.
Os dentes brancos e afiados
estavam à mostra. Os pelos, arrepiados. O corpo estava pronto para atacar.
Atacar Seth. Tudo o que Jacob pensava ou visualizava era Seth e o fato de ele
ter passado a tarde com Kahli. Não existia o amigo ali. Ele era apenas um cara
que poderia e, provavelmente, teria olhado para ela de uma forma que não
competia a ele. A palavra com “i” começou a aparecer em sua mente quando ele
voltou a terra subitamente. Sua mente era ligada à dos outros.
— Não quero discussões. –
Gritou mentalmente esperando que os amigos se calassem. – Seth, prossiga.
Foi uma saída de mestre. Antes
que notassem, ele simplesmente mudou o rumo dos pensamentos. Embora a ideia
tenha sido genial, não foi o suficiente para que os caras ignorassem.
— Estamos completamente
errados.
— Em que, exatamente? – Collin
falou com tédio, bocejando.
— Em tudo – gritou, fazendo os
outros encolherem-se. – De alguma forma, eles entram nas casas, gente.
— Como? Quem entra nas casas?
— Aqueles que atacam a cidade.
Eles entram nas casas trancadas! Acha que não encontrariam uma forma de nos
ludibriar e passar por nós?
— Quer dizer, que neste exato
instante, eles podem estar sequestrando alguém?
— Isso mesmo! – A animação de
Seth ao ser compreendido foi enorme. – Nossa ronda deve ser feita dentro da
cidade. Não fora dela.
— E como vamos explicar três
lobos enormes andando pelas ruas? – Embry olhou estranho para Seth. – Pelo que
eu conheço, nem todos sabem sobre nossa “condição”.
— Eles têm toque de recolher.
E serão cinco lobos. Entendem?
— Sim. – Responderam em
uníssono.
— Seremos nós cinco fazendo a
ronda. Estaremos descansados e dificilmente em desvantagem. Se houver algum
ataque, algum tipo de barulho estranho dentro das casas, nós escutaremos.
Assim, será muito mais fácil encontrarmos alguém, não acham?
Jacob ponderou a proposta. Era
uma ideia arriscada, considerando que alguém poderia sair de casa e
encontra-los perambulando pelas ruas, mas era o mais lógico a se fazer, levando
em conta a situação. Seth havia feito o que ele, como alpha, deveria ter enxergado há tempos.
— Alguém se opõe? – Ele perguntou
para os companheiros, que negaram veemente. – Ótimo. Vamos começar esta noite.
Dormiremos durante o dia. Vamos pegar esses caras e eles nem verão quem acabou
com eles.
Em uma animação que não havia
sido demonstrada anteriormente, três lobos seguiram em frente correndo e
discutindo estratégias para um inimigo, até agora, invisível. Seth e Jacob
ficaram para trás. Ambos transformaram-se em humanos para terem uma conversa
reservada.
— Olhe Jacob, - levantou as
mãos tentando manter-se longe da fúria que viu nos olhos do lobo - eu não fiz
nada que pudesse desrespeitar você ou Kahli.
— Eu sei. – Os dedos agarraram
os fios negros e os puxaram ao ponto de sentir dor. O que dera nele para quase
tacar o amigo? – Me desculpe. Eu não sei...
— Eu sei, Jacob. Você sabe que
não vai aguentar muito tempo longe dela, não sabe? – Comentou bruscamente. –
Você quase pulou no meu pescoço agora a pouco e isso vai piorar. Ela é especial
- um rosnado o parou. – Você sabe que é verdade, e estou falando isso como seu
amigo e amigo dela. Alguém vai reparar nisso e você não vai poder fazer nada,
porque ignorou o que está sentindo.
— Eu não estou sentindo! É
magia!
— Não é magia, Jacob! – O
grito de Seth espantou as aves que descansavam nas árvores. – Deixe de ser
idiota! É a sua vida, a sua felicidade em jogo! Vai jogar fora a sua felicidade
porque tem medo de ter um relacionamento que tem tudo para dar certo?
— Eu não escolhi isso. –
Respondeu-o, o maxilar anguloso travado.
— E a Bella? – Somente a
pronúncia do nome dela foi suficiente para causar uma dor pouco esquecida.
— O que tem ela?
— Você a escolheu?
Jacob deu as costas e caminhou
para a escuridão sem ligar para a conversa de Seth. Um erro. Sem que ele sequer
notasse, o mais novo agarrou-o pelo pescoço e o segurou contra uma árvore.
— Você a escolheu, Jacob?
Seth em nada se parecia com o
cara calmo e despreocupado. Os olhos estavam negros, as pupilas dilatadas
cobriam o doce castanho. Os cabelos revoltos mostravam exatamente o que ele
sentia. Revolta. Poucas horas, vendo as atitudes de Jacob para com aquela
benção, que caíra em seu colo deixaram-no assim.
— Você a escolheu, Jacob. E o
que ela fez? Escolheu outro.
A fincada no peito foi mais
profunda agora. Não se lembrava de que doía tanto ouvir isso. Mas porque doía?
Tinha tanto tempo desde o dia em que ela escolheu o Cullen. Tanto tempo que ele
se via perdido. Ele queria falar, retrucar as palavras duras dirigidas a ele,
porém, mal tinha forças para livrar-se do aperto de Seth, quanto mais para
falar.
— Se quer escolher a Kahli, então
conheça-a. Converse com ela. Escolha ela, Jacob! Entendo que dar esse passo
seja difícil, mas ele tem que ser dado para que você saia disso.
O aperto das mãos de Seth
diminuiu e ele soltou Jacob dando alguns passos para trás.
— Nós mal o reconhecemos. Você
não é você, Jake. Temos que crescer, mas eu não vi isso acontecer com você.
Você parou, se fechou. Não deu espaço para ninguém se aproximar, nem seu pai,
muito menos seus amigos. Agora você também não deu espaço para que ela pudesse
entrar. Imprinting é escolha, Jacob.
A sua escolha para ser feliz.
...
Fazia alguns minutos desde que
a mãe anunciara que iria dormir. Após isso, tudo era silêncio. A águia não
estava na janela, o que era estranho, Sibila não costumava tirá-la dos
“castigos” tão rápido assim. Entretanto, não reclamaria do surto de bondade da
mãe.
De banho tomado e pronta para
dormir, Kahli observava a marca em suas costas através do espelho. Ela não
parecia ter mudado desde a primeira vez que a vira ali, mas estava ardendo,
como se aquilo estivesse vivo e pulsasse. Não era ruim, só... estranho.
Kahli bufou olhando o reflexo.
Olhar a marca durante toda a noite não a faria entender o porquê dela.
Apagou a luz do banheiro e
seguiu para a cama. Contrariando o frio ao lado de fora, embaixo do edredom
estava quentinho. Quente. Sem saber o motivo, a palavra a levou para Jacob e a
marca nas costas pulsou com mais força.
Infelizmente, ou felizmente -
ainda estava tentando se decidir -, após Seth deixá-la na casa de Samantha, o
fato de saber com total certeza onde ele
morava a fez sentir-se viva, mais próxima do homem que a tratara tão mal com
palavras e, ao mesmo, tempo a acendeu com o olhar.
Um sorriso formou-se nos
lábios enquanto tampava o rosto com o travesseiro.
— Eu esperei vinte e três anos
para me sentir como uma adolescente boba – sussurrou contra a fronha. – Meu
Deus!
Estava prestes a apagar a luz
do abajur, quando escutou o barulho de algum objeto caindo.
— Mãe? – Deixou o travesseiro
de lado. – Tudo bem aí?
Ninguém respondeu, na verdade,
o silêncio aumentara. Apenas agora havia reparado, era um silêncio incomum. Sem
grilos chiando, corujas piando ou qualquer outro animal fazendo seus barulhos
naturais.
— Mãe! – Continuou chamando
por Sibila, porém num volume mais baixo.
Abriu a porta do quarto sem
produzir qualquer som e correu para o da mãe, fechando-se rapidamente lá
dentro.
A cama estava arrumada. Todo o
quarto encontrava-se organizado, como se a única pessoa que passara por ali durante
as últimas horas houvesse o feito, exclusivamente, para limpar o lugar.
Novamente ouviu o som de algo
caindo. O coração deu um salto no peito no exato instante em que escutou passos
na cozinha. Tinha alguém lá dentro.
Os dedos ao redor da maçaneta
tinham os nós brancos. Kahli soltou o ar pela boca e uma fumaça branca
comprovou que o frio do lado de fora havia entrado em casa. Como? Ela não
sabia.
A porta foi novamente aberta e
ela olhou para o corredor estreito. Não havia luzes acesas, mas pode enxergar
nitidamente figuras escuras se movimentando pelo cômodo. Procuravam algo. Todos
os armários estavam abertos e revirados, mas, aparentemente, não encontraram
nada. Os encapuzados não pareciam felizes com isso.
A saliva raspando na garganta
produziu um barulho seco que ressoou em seus ouvidos.
Eles ainda não a haviam notado,
portanto, sua chance era sair pela janela do seu quarto, a mais próxima dos
fundos da casa. Só precisava passar pelo corredor sem ser vista. Só.
Kahli fechou os olhos e
respirou fundo.
A marca nas costas pareceu
queimar enquanto atravessava o pequeno espaço e entrava no quarto. Ela ignorou
isso, correndo para a janela e levantando a tranca. O vidro subindo fez um
pequeno ruído que Kahli acreditou não ter sido ouvido, mas foi. Ela passou as
pernas pela janela e quando olhou para trás, mãos ossudas e brancas abriram a
porta arrebentando-a no processo.
Descalços, os pés esmagavam as
folhas e o que estivesse no chão. Os cabelos negros tampavam os olhos e ela mal
enxergava o caminho. Enxergar não era importante. Sair dali era. A boca estava
seca e o rosto, molhado de lágrimas que ela mal notara escorrer.
Verde.
Tudo atrás de Kahli era verde.
Como fogo, a luz de cor
incomum se alastrava pela floresta. As árvores pareciam esconder-se do brilho
enegrecido. Onde ele tocava, o frio aumentava, não a ponto de congelar como a
neve, mas um frio de morte.
Kahli escutava os mantos
escuros esfregando-se no chão enquanto eles se aproximavam. Eles pareciam
cochichar entre si sussurros infelizes e, à medida que se aproximavam, os
poucos animais que haviam permanecido ali corriam.
O pijama velho estava rasgado
e sujo das vezes em que caíra no chão. Com certeza não possuía mais azul
límpido de antes.
Respirar tornou-se um desafio
quando Kahli aproximou-se da casa de madeira. Havia tomado uma pequena vantagem
ao pular um estreito córrego há poucos metros dali, mas isso não os atrasaria
muito.
Por favor, tenha alguém lá dentro. Por favor, tenha alguém.
As luzes apagadas diziam o
contrário. Mesmo assim, ela conservou as esperanças.
Suas pernas começavam a arder
quando atirou-se contra a porta.
— Seth! – Gritou, dando vários
socos na madeira. – Seth!
Virou o rosto para trás, a
tempo de ver o encapuzado aproximar-se. A face erguendo-se.
Kahli prendeu a respiração e
encostou-se à porta.
— Tem alguém aí?
Continuou batendo, o ato
soando mais como um reflexo do próprio corpo do que se estivesse esperando sua
salvação. A figura sacudiu o corpo parecendo rir da situação. Os nós dos dedos
começaram a doer. A sensação percorrendo seus músculos. Tudo parou. A visão
escureceu. O coração, desesperado no peito, pareceu acalmar-se. Contudo, a
marca nas costas parecia latejar querendo sair de sua pele. A marca era a única
coisa que parecia estar viva naquele instante. Então, em um último ato de
desalento ela gritou. Gritou o primeiro nome que passara por sua cabeça desde o
início daquilo tudo. O nome que ela ignorara ao bater naquela porta.
— Jacob!
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