Samantha olhava desconfiada
para a melhor amiga sentada no sofá de sua sala. As pernas cruzadas sobre o
estofado balançavam em sinal de impaciência e as mãos batucavam a almofada
amarela que estava em seu colo. Apesar de não passar das nove horas e ser seu
dia de folga, ela tinha os lábios cheios de gloss e os olhos, castanhos
esverdeados, contornados por lápis, os cabelos, negros como os de Kahli,
estavam amarrados fortemente em um rabo, deixando o rosto moreno livre.
— Agora é a hora em que você
me conta porque chegou a minha casa, praticamente, na madrugada de sábado. –
Apontou em sussurros por causa da filha que dormia no quarto próximo.
— Me desculpe por isso, Sam. –
Kahli a olhou culpada. Aparecera sem avisar na casa da amiga, e, se não
bastasse, de “mala e cuia”.
— Não mude de assunto! – Samantha
arregalou os olhos e franziu os lábios, usando a mesma cara que fazia com
Selena, quando a menina fazia algo errado. De alguma forma, Kahli sentiu medo da
amiga. Estava claro ali quem era a mãe.
— Não estou mudando de
assunto! Sinto muito por invadir sua casa, mas não tinha nenhum outro lugar
para ir.
— Você é minha amiga e minha
casa tem quartos demais para apenas duas pessoas. – Sam abrandou a expressão por
alguns segundos. – Agora não rodeie e, bote para fora o porquê de estar aqui e
não na casa de Sibila.
— Saí de casa.
— Finalmente! – Exclamou
jogando as mãos para o alto. – E não me diga que aquele ser de corpo
completamente harmonioso teve alguma coisa a ver com isso.
O modo como Sam falou sobre
Jacob fez Kahli gargalhar silenciosamente. Em um momento ela era a mais velha
tentando arrancar alguma confissão e, em outro, se tornava a adolescente com adjetivos
incrivelmente criativos para homens bonitos.
— Eu ainda estou tentando
entender porque eu saí, Sam.
— Não me venha com essa
desculpa Kahli. Você, de nós duas, é a que sempre gostou de pensar mais e veja
onde isso deu?! – Gesticulou para as mochilas no chão.
— E você, que não gosta de
pensar... – Kahli deixou a frase em aberto para a amiga completar.
— Acabei engravidando de um “gringo”?
– Semicerrou os olhos, fingindo, propositalmente, uma cara de brava. – Sim, eu
engravidei daquele idiota, mas... – levantou o indicador para o teto – você não
pode negar que eu escolhi bem. Porque, sério mesmo, ele tinha os melhores
espermatozoides da região e era bonito. Sabia que homens bonitos tendem a ter
espermatozoides mais bonitos e saudáveis do que homens feios? Li isso em uma
pesquisa de alguma universidade importante. – Terminou o comentário com um
sorriso de orelha a orelha. De mãe responsável a jovem “espertinha”, tudo isso
em poucos segundos.
— Quando foi que nossa
conversa chegou a espermatozoides?
— Quando você resolveu me
retrucar. Agora desembuche!
— Okay. – Pigarreou antes de
retomar as palavras. – Olha, eu estou bem e inteira, então não se preocupe com
o que vou dizer agora.
— Entendi, agora me diga o que
aconteceu.
— Invadiram minha casa ontem à
noite e tentaram me pegar.
Samantha ficou estática por
apenas alguns segundos, mas eles foram suficientes para que a amiga se
preocupasse a ponto de correr para sentar-se ao seu lado.
— Sam!
— Oh meu Deus! – Sussurrou
abraçando Kahli. – Você está bem, não é?
— Estou. Disse para não se
preocupar. – Sentiu a camisa que usava ficar molhada.
— O que me pede é algo
impossível, Kahli! – Falou soltando-se da amiga e secando os olhos com as
costas da mão, fazendo o lápis preto manchar o restante de seu rosto. – A gente
ignora o que acontece com os outros ou, pelo menos, fingi que não supera os
desaparecimentos, as mortes. Mas quando isso acontece com alguém que gostamos
é...
— Devastador – completou a
frase, engolindo em seco.
— Isso mesmo.
— Mas agora vem a parte que
você, provavelmente, irá surtar.
— Não me diga que conseguiu
descobrir quem está sequestrando os nossos e, de quebra, matou um?
— Quem dera – falou
tristemente. – Não, Sam, nada disso ocorreu. – Suspirou, recordando-se de como
o temor havia desaparecido, assim que, o enorme lobo surgira. Ela sabia que o
lobo era ele. – Jacob me salvou.
— Como?! – Samantha
questionou-a com um sorrisinho nos lábios.
— Não é nada disso, Sam. –
Negou o que sabia que a amiga estava pensando, mesmo sabendo que não havia sido
apenas uma ajuda, um auxílio.
— Então o que foi?
A ansiedade estava de volta,
mas, dessa vez, por motivos diferentes. Kahli queria dizer o que estava se
passando dentro de si, mas como contar sobre algo que ela não tinha o menor
conhecimento do que era? Por isso, ergueu-se da poltrona e caminhou pelo cômodo
de um lado a outro. Os dedos retorcendo-se de nervosismo não ajudavam em nada e
a calça, de número bem maior que o seu, arrastando-se no chão, também não.
— Kahli! – A amiga chamou-a. –
Eu sei que você ama pensar e mandar nos outros, e guardar tudo só para você,
também, mas tem que me contar o que aconteceu. Melhores amigas, lembra?! –
Kahli assentiu, concordando. – Ótimo. Eu entendi que você foi atacada e que
Jacob a salvou... Mas não foi só isso, foi?
— Não. – Balançou a cabeça,
acentuando a resposta.
— Então conte.
Kahli desviou o olhar para a
camisa de um time de futebol que ela desconhecia. A peça ainda tinha o cheiro
de Jacob.
— Eu iria ser pega, e estava
tentando ignorar o nome dele piscando na minha cabeça a todo momento. Não deu
certo – sacudiu os ombros, como se não se importasse. – Quer dizer, isso de
ignorar. Eu o chamei e ele veio.
— Jacob.
— Sim – não foi uma pergunta,
mas, mesmo assim, Kahli respondeu. – E quando eu estava prestes a apagar, eu o
senti. O calor do corpo. O cheiro – fechou os olhos recordando-se da sensação.
– Eu mal lembrei-me disso mais cedo, por causa da minha mãe. A única coisa que
eu tinha certeza era de que, se ela não aceitava Jacob e não tinha a humildade
de agradecer a ele e aos outros, então eu não podia conviver com ela – suspirou
com tristeza. – Eu me cansei de tê-la mandando na minha vida, no meu futuro.
Não aguento mais os resmungos dela sobre a família Black. Só quero um pouco de
paz. Depois Jacob me ajudou com a mudança e, ao chegarmos aqui na porta ele me
bombardeia com aquele sorriso brilhante e me chama para sair. É muita coisa
para processar.
— Espere, - Sam pausou a fala
dramaticamente e apontou o dedo para o teto – Jacob te chamou para sair?
— Você escutou o que eu disse?
— É claro que escutei! Você
tem essa atração louca por um cara que conheceu há três dias – terminou com um
sorriso do gato de Cheshire.
— Não é só isso, Sam! –
Engoliu em seco pensando se iria mesmo dizer aquilo. – Tem algo nele que...
— Te marca – completou
Samantha, a voz soando bem mais séria que o usual.
— É. Uma marca que está
gravada na minha pele a ferro e fogo.
...
Essa podia ser a segunda
reunião do Conselho de Loren que ele participava, mas parecia que sempre se
impressionaria com o número de pessoas e com o modo que algumas delas
aparentavam odiar tomar parte daquilo.
Sibila parecia uma cascavel
pronta para “dar o bote”. Talvez ainda não fosse com a sua cara e, nunca iria,
principalmente depois que ele ajudou a filha da mulher a fazer as malas e ir
embora de casa.
Ossos do ofício... Ninguém
possuía a capacidade de agradar a todos.
Elias chamou a atenção para o
início do encontro.
As caras assustadas dos
presentes divertiam um pouco os rapazes da matilha, claro, os motivos não eram
divertidos, mas poder esfregar na cara deles que os quileutes eram, sim, úteis
e eficientes colocava-os em uma situação bastante confortável.
— Sim, eles foram chamados
aqui para isso, não? – Retrucou Sibila, destilando veneno, e Elias suspirou
descontente. Jacob não desejaria tomar o lugar do homem nem por milhões de
dólares.
— Mais alguém tem algo a
acrescentar? – O Líder perguntou, aparentemente ignorando a última
manifestação.
Um homem levantou a mão,
tomando a frente:
— Como “ele” era? –
Questionou, exclusivamente, o alpha.
— Alto, magro, - Jacob ficou
de pé, ao lado de Elias – usava um manto negro, tinha olhos verdes e pele
pálida. – Enfiou as mãos nos bolsos e olhou para cada mulher e homem sentado
ali. – Quero saber tudo o que conhecem sobre esse ser. Duvido que seja a
primeira vez que o encontram – esfregou a testa, lembrando-se do que o pai
dissera mais cedo.
— O que Jacob quer dizer, é
que procuremos nos registros, livros, tudo o que tiver alguma informação sobre
nosso passado. Precisamos encontrar algo sobre o que vem nos atacando.
Os resmungos se fizeram
audíveis, ninguém pareceu satisfeito com o ultimato e Sibila tomou as dores dos
outros para si.
— É trabalho deles fazer isso!
– Apontou para os quileutes e, antes que Elias pudesse responder algo, Jacob se
pronunciou. Os ombros tensos o deixando ainda mais alto e imponente.
— Com todo o respeito, -
trancou o maxilar – mas a senhora invadiu minha casa esta manhã sem a menor
demonstração de compostura por mim ou por sua própria filha, que estava ferida
e abalada por conta do ataque de ontem à noite. Desde que cheguei aqui, vem
demonstrando apenas descaso com o nosso trabalho – apontoou para os Irmãos. – E
agora se recusa a ajudar seu próprio povo. – Falou, aproximando-se
perigosamente da mulher. – Sei que isso tem algo a ver com meu pai, - Sibila
arregalou os olhos negros, levemente – e não me importo. Se tem algum assunto pendente,
resolva com ele, não comigo, com os outros ou com sua filha. Estou aqui apenas
para ajuda-los, não para agradá-los, entretanto, não posso fazê-lo arriscando a
meus Irmãos e a vocês, por isso, - retirou as mãos dos bolsos e cruzou os
braços sobre o peito – se quiser auxiliar, ótimo, se não, cale a boca e saia da
frente.
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